Liguei a televisão. “A Vida é Bela” –
esse era o nome do filme. É mesmo. Não só é mesmo o nome do filme como é mesmo
bela, a vida. O filme é bom e meio piegas. Eu também. Um bom sujeito e às vezes
meio piegas.
O que importa é: a vida é bela.
Dói. Às vezes dói. Até saber que dura
pouco, dói.
Mas presta atenção, colega, tem quadros
de Van Gogh, sorvete de flocos, papos de madrugada com amigos. E isso é
inegável.
Ok, você se lembra do garoto com fome na
rua, se lembra que ainda existe luta religiosa, se lembra que a amiga a quem
você deu atenção confundiu as coisas e te chamou de “galinha”, se lembra que
fazem fofoca sobre você, se lembra da distensão muscular no melhor momento da
pelada. Mas é bela. A vida é bela. Encontros de afeto real justificam esse
planetinha bonito.
Ok, colega, dói porque à esquerda não
nos salvou ao chegar ao poder (nem existe mais esquerda). Dói porque a
psicanálise prometeu, mas não nos fez felizes para sempre. E os hippies viraram
mendigos ou burocratas.
Mas a vida, colega, tem Domingos de
Oliveira. E ele também acha a vida bela. E Domingos não mente. Imagine um cara
que além de ser o maior pensador do Brasil, tem no primeiro nome um domingo no
plural, numa espécie de multiplicação do feriado. Segundo ele, reclamar da vida
é o oitavo pecado capital. Portanto, não vamos ficar resmungando. A vida é
bela.
O tempo passa, o tempo estraga, o tempo
mata, a vida volta, a vida recompõe, a vida renasce.
Você não gosta do programa da tv. Aí
está ao seu lado o controlo remoto, supremo representante da sua democracia. O
verdadeiro poder do povo é o controle remoto.
Ok, os nazistas cristãos odeiam os
judeus e Cristo era judeu e não odiava ninguém. Paradoxo dói. A gente não
confia no político que está aí para nos representar. E tem medo da polícia que
está aí para nos proteger. Mas tem o corpo da mulher amada, o bandolim de
Hamilton de Hollanda e milk-shake de Ovomaltine. E é interessante. O tal do ser humano é
interessante. Sempre procurando o amor definitivo e a tal da segurança. Logo
ele, capaz de morrer no próximo minuto, sujeito à primeira ventania, e sem a
menor chance diante do menor maremoto. A segurança, colega, não existe. A gente
inventou. E isso dói.
E lá no meio da dor tem uma tal de
esperança. E como a flor que nasceu no asfalto, do Drummond, ela vive ali,
sobrevivendo a caminhões e atropelamentos. Ok, colega, eu sei que dói. Mas tem
a hora em que teu filho dá uma gargalhada e é feliz. Aí a gente se lembra dele
em cima do nosso ombro e olhando espantado para o mundo. Naquele dia a gente
disse pra ele (e pra filho não se mente): a vida é bela.
Oswaldo Montenegro
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