A realidade é um
bêbado jogado no chão, até que alguém bata na minha porta e prove o contrário.
É a unha que descascou logo que você saiu do salão, toda
feliz. É o barulho [insuportável] do telefone quando está descarregado.
A realidade irrita.
Irrita porque está ali na sua cara e muitas vezes você não
quer ver ou vê coisas que não condizem com a sua concepção de realidade. Porque
querendo ou não, a realidade é carne crua.
Tem dias que eu visto minha fantasia de otária. Não é nada
além de um kit composto de um sorriso de largura 7 cm e um olhar como se alguém
tivesse jogado um tubinho de purpurina em você. Aquela coisa meio.. ãmn..
hiperbolicamente brilhante. E quer saber? É uma merda. Dá vontade de mandar
meia dúzia de gente tomar no cu e correr pra casa chorando, se trancar no
quarto pra tomar um toddy e jogar nintendo até ficar vesga.
Isso de escolher qual cara eu vou vestir hoje fode com tudo. Sempre.
Isso de escolher qual cara eu vou vestir hoje fode com tudo. Sempre.
Entenda. Pego ônibus as sete e dez e digo olá-árvores.
Olá-pássaros. Olá-universitário-que-não-lavou-o-rosto-… E por aí vai, aquele
jogo de sorrisos. O dia todo. Todos os dias.
O ônibus que eu pego está sempre lotado de seres que moram
em um mundo onde aparentemente não se vende desodorante. A escola está numa
velocidade dez quilômetros por ano. Minha sobrancelha está mal feita.
É, eu confesso que não é exatamente a realidade que eu
esperava encontrar.
[A realidade que eu mais gosto está longe, bem longe. Eu e
você, pãezinhos com requeijão, lençol bagunçado sobre a cama, luz entrando pela
janela, coca-cola com gelo e limão.]
Talvez isso mude. Talvez você entre na minha vida sem tocar
a campainha e me seqüestre de uma vez. Talvez você pule esses três ou quatro
muros que nos separam e segure a minha mão, assim, ofegante, pra nunca mais
soltar. Talvez você ainda possa pular no rio e me salvar.
Ou talvez eu só precise de férias, um porre e um novo amor.
Porque no fundo eu sei que a realidade que eu sonhava
afundou num copo de cachaça e virou utopia.”
Caio Fernando Abreu
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